O Trabalhador

Levanta de manhã o bom trabalhador,
Sereno e contrafeito, ao peso da desgraça,
Para a oficina vai o nobre lutador,
Olhando com desdém pelo burguês que passa.

Começa a trabalhar no intenso labor
Gasta a força viril herdada de sua raça,
Enquanto o seu patrão, o infame explorador,
No luxo e no prazer a vida inútil passa...

E à tarde, quando volta à mísera morada,
E põe-se a refletir na sorte desgraçada,
Solta gritos de dor como um leão a rugir.

Desejando fazer, com desejo profundo,
Explodir este abjeto e miserável mundo
E sobre a ruinaria outro mundo construir !


José Máximo

imagem: http://kwerfeldein.deviantart.com/

Cristo - Proletário

É a ti que me dirijo, humilde proletário,
Mártir das opressões sociais, que és hoje em dia
O piedoso judeu que o clero e a burguesia
Arrastam, sob a cruz da miséria, ao calvário:

Ergue a fronte e abandona esse ar de covardia,
A servil submissão desse cristo lendário,
Torna-te um revoltado, um ladrão, um incendiário,
Mas lança fora do ombro a cruz que te angustia!

Ouve a voz da razão, contempla a luz da Ciência,
Olha a fartura que há, o luxo desbragado,
Vê o opróbrio em que estás, nessa negra indigência!

Enfrenta a corja vil que a morte te conduz:
Mais vale ser no ardor da luta aniquilado
Do que morrer, inerte e triste, numa cruz!


Raimundo Reis
20/04/1935
Publicado em: -A lanterna, jornal anticlerical e libertário- São Paulo, nº 393.

Desenho de Doug Fraser

O Gigante Acordou

Era uma vez um gigante
Acomodado e confortável...
Em sua vida alienante 
Um jovem "responsável"

Das causas sociais sempre distante
"Pensando no futuro" 
Que não inclui seu semelhante

Viu pela TV um movimento 
Como vários nos últimos anos 
"Condenável obra de estranhos" 
Coisa demais pro seu entendimento

O jornal aquilo condenou 
O gigante concordou

Era contra o aumento da passagem 
Coisa que pro gigante era bobagem

A pauta do movimento se ampliou 
Por várias cidades o protesto se alastrou 
E o gigante indiferente continuou

Mas a mídia sua estratégia modificou 
O protesto supostamente ela apoiou 
Seu verdadeiro significado deturpou
 E o gigante então acordou!
E acordou bem atrapalhado 
Ele parecia querer lutar
 Mais não sabia bem de que lado

Viu a polícia lhe atacar
 E não pôde acreditar: 
- O policial não é o mocinho, 
   que vem pra nos salvar?

Perdido, foi a TV ligar 
Então achou o caminho 
Não era pra fazer escândalos 
Pois tudo era culpa dos Vândalos!

O gigante descobriu sua missão 
Ser polícia interna na manifestação

Gritava: - Sem Violência 
             - Sem Vandalismo 
E sabotava a resistência 
Em nome do moralismo

De grande cegueira acometido 
Se metia a traidor 
Confundindo a resistência do oprimido
 Com a violência do opressor

O gigante pedia paz 
A polícia mandava gás 
O gigante então fugia 
Deixando seus companheiros pra trás

E se alguém resistia 
O gigante em histeria 

Sua velha cantiga pacifista repetia

A autodefesa não é legítima 
Uma “boa imagem” pro movimento 
Vale mais que sua integridade física 
Que todos se contenham nesse momento 
Suportem as agressões agradecendo 
Para que só nós sejamos “a vítima”

Protesto é luta, não penitência 
Ó gigante defensor “das coisas boas” 
Pra quem é mais importante a aparência 
Do que a integridade das pessoas

Perdoe esses revoltados 
“Que estragam O SEU belo protesto” 
Que sejamos sempre uns coitados
Implorando políticos honestos

Perdoe os vândalos terríveis 
Seres tão insensíveis 
Que saem quebrando as coisas
Cada coisa que simboliza 
Tudo o que você admira: 
Governo, repressão, mídia 
Estado, propriedade, hierarquia

O gigante nunca fez muitas reflexões 
Ele dizia querer transformar 
Mas era defensor das instituições 
Que fazem todo povo penar

Parecia apontar uma nova via 
Mas só mantinha 
Tudo na velha ordem estabelecida

Ia ao protesto pra ficar sentado 
Na hora que deveria ser ousado 
Isso não quer e nem percebe 
Pois a ousadia é coisa da plebe

Já o gigante "refinado donzelo" 
Adornado de verde-amarelo 
Não afeito a “deselegâncias” 
Desconsiderava as circunstâncias

Mas depois que tanto brincou 
O gigante cansou 
E sua revolta passou... 
Já se encontra novamente 
"Deitado eternamente" 
Em confortável "berço esplêndido"


Luiz Aurélio