A Hora

Eis a Hora, a grande hora da peleja,
Hora de sacrifícios e entusiasmo!
Pulsa meu coração, meu peito arqueja
No momento da ação replito e pasmo.

É a batalha final! Trovo, troveja,
Além-mar, o canhão; foi-se o marasmo
Da plebe una, e a revolta bemfazeja
Move espada e morrão, ódio e sacasmo.

Levantam-se os escravos contra os amos!
Há um clamor de vitória em toda a Terra...
Somos nós, anarquistas, que clamamos!

Nós que vamos sorrindo e subvertendo,
Arrastando os irmãos à Maior Guerra,
Num rebate de loucos, estupendo!

José Oiticica
Sonetos 2ª série (1911-1918) de 1919

Desgarrão

O operário não tem onde morar
Coitado! E faz de um quarto infecto, imundo,
Aperitivo, nojento, nauseabundo,
O seu divino e sacrossanto lar.

E ali, uma hora a rir, outra a chorar
Ele arrasta a existência, neste mundo,
Como um cachorro, inútil vagabundo,
À procura de um lixo pra fuçar.

É a multidão, esse poder eterno,
É esse alimento que o burguês consome
Dando-lhe, em paga, um torturante inferno.

Sempre esta coisa cômica e sem nome:
O povo mata a fome ao governo
E o governo reduz o povo à fome.

Carlos Bacelar
11/03/1933

Ao escritor

Curto é o período de um dia
Curto é o espaço de uma vida
Rápida como páginas lidas...
Que podem ser longas
Quando é algo que significa
Pois possui prolongamento
Para além daquele tempo
Em que você as ficou lendo
É algo que contagia

Ficam em processamento
Lhe estimulam o pensamento
Despertam sentimentos
Que geram movimentos

Apenas papel e tinta
Podem ser algo mais
Dependendo do conteúdo

Apenas a breve vida
Pode ser algo mais
Dependendo do conteúdo

Aurélio