Poema de um trabalhador sobre a sua interpretação de Vanguarda

Vocês disseram que me ajudaria,
Que eu não entendia,
A minha exploração.
Disseram que era preciso estudo,
Para obter a compreensão.
Por isso deveríamos seguir a sua revolução.
Entretanto, a realidade
Me mostrou a verdade.
Mudou somente o patrão,
O discurso foi em vão,
Manteve-se a reprodução
Da exploração.


Adriano José

No mundo há muitas armadilhas

No mundo há muitas armadilhas

        e o que é armadilha pode ser refúgio
        e o que é refúgio pode ser armadilha

Tua janela por exemplo
       aberta para o céu
       e uma estrela a te dizer que o homem é nada
ou a manhã espumando na praia
       a bater antes de Cabral, antes de Tróia
       (há quatro séculos Tomás Bequimão
       tomou a cidade, criou uma milícia popular
       e depois foi traído, preso, enforcado)

No mundo há muitas armadilhas
      e muitas bocas a te dizer
      que a vida é pouca
      que a vida é louca
      E por que não a Bomba? te perguntam.
      Por que não a Bomba para acabar com tudo, já
      que a vida é louca?

Contudo, olhas o teu filho, o bichinho
      que não sabe
      que afoito se entranha à vida e quer
      a vida
      e busca o sol, a bola, fascinado vê
      o avião e indaga e indaga
A vida é pouca
a vida é louca
mas não há senão ela.
E não te mataste, essa é a verdade.

Estás preso à vida como numa jaula.
Estamos todos presos
nesta jaula que Gagárin foi o primeiro a ver
de fora e nos dizer: é azul.
E já o sabíamos, tanto
que não te mataste e não vais
te matar
e agüentarás até o fim.

O certo é que nesta jaula há os que têm
e os que não têm
há os que têm tanto que sozinhos poderiam
alimentar a cidade
e os que não têm nem para o almoço de hoje

A estrela mente
o mar sofisma. De fato,
o homem está preso à vida e precisa viver
o homem tem fome
e precisa comer
o homem tem filhos
e precisa criá-los
Há muitas armadilhas no mundo e é preciso quebrá-las.


Ferreira Gullar

Trabalho calvário

Antes mesmo do sol raiar
Já acordados pra ralar
Quem a duras penas consegue viver
Que trabalha tanto e continua a sofrer
Para que outros possam enriquecer
E desfrutem do luxo e do prazer
Aqueles mesmos que você
Proporciona mas não pode ter

Diante disso podemos escolher
Ou simplesmente aceitar...
e emudecer...
Ou ousar pensar...
E lutar...
Para que as coisas diferentes possam ser


Aurélio
2 de novembro
2011

Da incapacidade de amor



A todos os amantes que insistem em ser felizes

O amor dos poetas foi sempre algo sublime demais,
Uma nuvem tênue que não alcança as pessoas reais.

De nada vale um amor destes para sermos felizes.
Também não basta o que oferecem as meretrizes.

Mas o problema verdadeiro não reside na alma individual,
É uma força muito mais ampla, é uma relação social.

O mal do qual padece hoje toda a espécie humana
Foi uma vez expressa naquela máxima hobbesiana.

Mas se o homem é o lobo do próprio homem,
Quem é o lobo do lobo do homem?

Se venceu a mentira darwinista da seleção natural,
Retornou o homem a ser novamente só animal?

Se venceu Freud e toda a sua fantasia do Édipo,
Deixou o homem de ser real, para ser mero arquétipo?

Pois, se se revigora da competição o capitalismo,
O amor torna-se para ele mais um fetiche de consumismo.

Sendo do homem o amor uma grande potencialidade,
Converte-se nos dias de hoje em bem da publicidade.

Ehhh!!! Só haverá nesta vida amor verdadeiro
Quando o homem decidir mudar o mundo inteiro.

Melhor dizendo, só haverá finalmente amor de verdade
Quando a classe operária construir uma nova sociedade.


Lucas Maia

Dia após dia


É forte muito forte
Mais forte que você possa imaginar
A nossa vontade de lutar
É livre, muito livre
O nosso desejo de amar
É triste, muito triste
O mundo do jeito que está
Que dia após dia está a se perder
Em vez de se encontrar
É revoltante muito revoltante
Saber que as pessoas aceitam
Ser manipuladas a todo instante.
Sonho de acordar em um novo dia
Onde eu possa viver em anarquia
É lindo, muito lindo
O seu sorriso, diante
Os destroços desse sistema falido.

(Gilcélio)
http://vomitossubversivos.wordpress.com/

Hino Primeiro de Maio

Vem, ó Maio, saudam-te os povos,
em ti colhem viril confiança;
Vem trazer-nos cerulea bonança,
Vem, ó Maio, trazer-nos dias novos!

Vibre o hino de esperanças aladas
ao grão verde que o futuro matura,
à campina aonde a messe futura
já flori sobre as negras queimadas!

Dezertai, ó falange de escravos,
da lavoura, da negra oficina;
um momento de tregua à fachina,
ó abelhas roubadas aos favos!

Lavantemos as mãos doloridas,
e formemos um feixe fecundo;
nós queremos reunir este mundo
dos senhores da terra e das vidas.

Sofrimentos, ideais, juventude,
primaveras de turbina arcano,
verde Maio do jenero humano,
daí corajem aos animos rudes!

Enflorai ao rebelde caido,
com os olhos fitando o nascente,
ao obreiro que luta fremente,
ao poeta, jentil, esvaido.


Jornal A Voz do Trabalhador - 1914
*optamos por manter a grafia original

Arte e ciência

Artistas e pensadores?
Mercenários e traidores!
Se pondo à serviço do poder
Serviçais dos dominadores
Cúmplices e colaboradores
De tudo que traz o aniquilamento
da livre arte e pensamento

arte, ciência?
Engano, elitismo...
assim colocados
que pena.

Talvez o dia venha
Dias de um mundo novo
E recebam vida do povo...
Então a arte e a ciência
deixarão de ser um problema


Luiz Aurélio
Neno Vasco
A chama canta, salta e corre,
O velho burgo tomba enfim...
Oh! Quanto abutre cai e morre!
Oh! Quanto abutre em seu festim!
De face a ardear, que a chama cresta!
Ó párias nus, vindes dançar,
Dançar em roda, correr, cantar
Que esta fogueira é vossa festa!
            A chama a crepitar!
Em círculo formai!
            Dançai!
            Dançai!
De archote aceso, o mundo iluminai!


Neno Vasco

Fora todos os opressores!

Fora Marconi com certeza
Porém não com delicadeza
Protestemos com rudeza
Por que rude é a riqueza
Que acumularam com frieza
Os que roubaram com destreza

Ser governado é dureza
O poder é corrupto por natureza
Sua existência é pro povo a tristeza
Da opressão, exploração e pobreza
Da competição, desunião e fraqueza
Do medo, incapacidade e incerteza

Façamos então limpeza
Lutemos com firmeza
Fora Marconi com rudeza
Fora detentores da riqueza
Fora bandidos da grandeza!

A solução não é surpresa...
O povo possui a chama acesa
Pra destruir a vil torpeza
Pra construir com profundeza
A revolução, maior proeza
Autogestão sua fortaleza

Aurélio
(distribuído durante um protesto em Goiânia do movimento Fora Marconi, ano de 2012)